sábado, 7 de maio de 2011

Alguém me diga...


O PEC IV e o Acordo UE/FMI: tirem as vossas próprias conclusões
São conhecidas as várias posições que o PSD foi tendo sobre o PEC IV. Em português, dizia que ia longe demais, com medidas socialmente injustas. Em inglês, dizia o contrário, que o PEC IV não ia suficientemente longe, que devia ser mais duro.

Agora que se conhece que o acordo negociado entre o Governo e a Comissão Europeia/BCE/FMI foi, apesar de tudo, menos duro do que se previa (na linha com os programas da Grécia ou da Irlanda), o PSD tenta reclamar os louros numa negociação onde esteve praticamente ausente.

O único problema é que o acordo contempla as medidas que constavam do PEC IV, que o PSD rejeitou no Parlamento porque – dizia - não serviam para o país (por excesso ou por defeito, dependendo dos dias e dos idiomas). Restava ao PSD uma de duas opções: 1) reconhecia que o PEC IV era, afinal, o que o país precisava; 2) ultrapassar este problema dizendo que qualquer semelhança entre o PEC IV e o acordo é pura coincidência ou, nas palavras de Passos Coelho, “qualquer ideia de que o PEC IV tenha estado na base do memorando de entendimento é uma pura fantasia”.

Esta tentativa não resiste ao mínimo teste, conforme, aliás, as próprias declarações das instituições internacionais parte do acordo, seja no início do processo (the programme will be based; (…) the set of measures announced by the Portuguese authorities on 11 March is a starting point in this regard. Ecofin de 8 de Abril), seja já depois do acordo estabelecido (''Troika'' diz que PEC IV foi "um bom ponto de partida" para a elaboração do plano).

Isto não é uma questão de fé ou interpretativa, mas a mera constatação de que todas as medidas que o PEC IV contemplava estão incluídas no acordo, como se pode ver facilmente:

Acordo UE/FMI - PEC IV

1 - Congelamento do crescimento despesa - SIM
2 - Congelamento de aumentos na função pública 2012-2013 - SIM
3 - Reestruturação das taxas do IVA - SIM
4 - Aumento do imposto automóvel, aumento do imposto sobre tabaco - SIM
5 - Cortes nas deduções e benefícios fiscais no IRS (limites máximos para saúde, educação e habitação, progressivo por escalão de IRS) - SIM
6 - Cortes nos benefícios fiscais e regimes especiais no IRC (eliminação de taxas especiais, eliminação de isenções fiscais subjectivas, redução das deduções por menos valias, período de reporte de prejuízos passa para 3 anos, limitação do tratamento fiscal das compras de veículos por empresas) - SIM
7 - Harmonização do regime fiscal das pensões, aproximando aos trabalhadores do activo - SIM
8 - Congelamento das pensões, garantindo o aumento das pensões mais baixas;
SIM
9 - Reduções nas pensões acima dos 1500 €, de forma progressiva, tal como aconteceu nos salários - SIM
10 - Combate à evasão fiscal e criação de mecanismos de reforço do controle orçamental - SIM
11 - Redução do Orçamento da Educação (agrupamentos, central de compras, contratos de associação) - SIM
12 - Limitação de entradas de funcionários públicos (com o objectivo agora definido de redução de 1% na administração central e 2% na administração local, sem recurso a despedimentos) - SIM
13 - Medidas para o reforço do sector bancário (redução das necessidades de financiamento, garantia de liquidez, aumentos de capital) - SIM
14 - Avaliação das Parcerias Público-Privadas - SIM
15 - Redução da despesa no Sector Empresarial do Estado (redução custos operacionais, tectos máximos de despesa, redução indemnizações compensatórias, tectos de dívida) - SIM
16 - Redução de 15% dos dirigentes e fusão de serviços da administração pública, 2ª fase do PRACE, PRACE para autarquias - SIM
17 - Redução de transferências para autarquias e regiões - SIM
18 - Promoção da flexibilidade e mobilidade na administração pública - SIM
19 - Saúde [aplicação da condição de recursos taxas moderadoras, corte de 2/3 das deduções fiscais na saúde; reduções nos subsistemas; prescrição electrónica] - SIM
20 - Mercado Laboral [reforma subsídio de desemprego e conteúdo do já acordado em concertação social sobre indemnizações e fundo para as indemnizações] - SIM
21 - Reformas estruturais já previstas no PEC IV: Mercado de trabalho; Sistema judicial; Mercado de arrendamento e reabilitação urbana; Energia; Saúde; Transportes; Serviços; Concorrência. - SIM


Perante isto, restava ao PSD mistificar algumas medidas do PEC IV, para poder vir dizer que tinham ficado de fora deste acordo. Foi o que Pedro Passos Coelho tentou fazer com as pensões mais baixas, ao dizer que o PEC IV as congelava, o que é absolutamente falso. Basta ler o PEC apresentado ao Parlamento (página 7), onde se escreve: “Dada a dimensão do esforço de consolidação, será necessário suspender, nos próximos dois anos, a aplicação da regra automática de indexação de pensões, salvaguardando a actualização, embora moderada, das pensões mais baixas”.

Como se diz acima, cada um pode tirar as suas conclusões.

Tiago Tiburcio